Gloria à Rainha | É Tudo Verdade


O mundo reagiu com surpresa quando O Gambito da Rainha, multipremiada minissérie da Netflix, se tornou um verdadeiro fenômeno. Um dos títulos mais assistidos da plataforma de streaming, a obra atraiu a curiosidade da audiência pelo xadrez, principalmente a parcela feminina do público. Direta ou indiretamente, isto é consequência do destaque da personagem vivida por Anya Taylor-Joy num esporte praticado em sua maioria por homens. Mas tal protagonismo feminino não é necessariamente novidade.

A Geórgia é um pequeno país da Europa Oriental onde o xadrez sempre teve grande popularidade. Uma nação com tamanha tradição no esporte que é de praxe presentear noivas com um jogo de xadrez como parte do dote de casamento. De lá, emergiram 4 enxadristas que foram imortalizadas como lendas do esporte. Nona Gaprindashvili, Nana Alexandria, Maia Chiburdanidze e Nana Ioseliani se tornaram estrelas de projeção mundial entre as décadas de 1960 e 1980, quando a Geórgia era parte integrante da União Soviética. Seus nomes, que foram emprestados a inúmeras mulheres nascidas no país em homenagem à elas, até hoje são considerados sinônimos de emancipação feminina e seu legado inspira gerações de mulheres a lutarem por autonomia e excelência profissional. As Nonas, Nanas e Maias anônimas também protagonizam  junto com as popstars do xadrez.

Trailer

Ficha Técnica
Titulo original e ano: Glory to the Queen,2020. Direção: Tatia Skhirtladze. Co-Direção: Anna Khazaradze. Nacioanalidade: Áustria,  Geórgia e Sérvia. Entrevistas/Elenco: Nana Alexandria, Nana Ioseliani, Maia Chiburdanidze, Nona GaprindashviliTrilha Sonora Musical: Aleksandra Vrebalov. FotografiaSebastian ThalerIdiomas: Alemão, georgiano, sérvio, russo. Classificação indicativa: 14 anos.  Duração: 82 min.
Na realidade em que o famoso quarteto se consagrou no esporte, a bênção de um homem era a porta de entrada para o mundo do xadrez. Boa parte delas foi ensinada por alguma figura masculina, como o pai ou o irmão. De certa forma, é como se, independentemente de seu talento e dedicação, as enxadristas precisassem da aprovação patriarcal para ser validadas no meio. Na mídia, eram obrigadas a posar como donas de casa, esposas e mães, frágeis, zelosas e submissas, escondendo o fato de que não cozinhavam ou que passavam meses a fio longe dos filhos e do marido durante turnês de torneios de xadrez ao redor do mundo. Aparentemente, a imagem de uma mulher colocando a carreira acima de seus papeis domésticos era contrária ao projeto de família nuclear tradicional vendido pela sociedade da época. Tal tratamento, contudo, é condizente com a cultura de um país que não permitia a entrada de mulheres em clubes de xadrez até meados dos anos 1900. Mesmo depois disso, o papel delas nestes institutos era meramente decorativo até 1920, quando passaram a ter direito de efetivamente ter contato com os tabuleiros do jogo e puderam conquistar seu lugar no xadrez competitivo. 


O documentário de Tatia Skhirtladze intercala entre cenas da era de ouro das enxadristas com registros recentes que as mostra em torneios de xadrez sênior, administrando escolas de xadrez que ensinam o esporte para novas gerações ou em atividades corriqueiras, humanizando estas lendárias mulheres. Comparando imagens das duas épocas, é possível perceber, por exemplo, como a ascensão do quarteto no esporte vai atraindo mais e mais mulheres como expectadoras das partidas, provando que representatividade importa sim. O maior trunfo de Glória à Rainha é ressaltar as diferenças entre suas protagonistas. Unidas pelo xadrez, possuem personalidades e opiniões bastante distintas. Nona, por exemplo, era do Partido Comunista, enquanto Nana Alexandria era da oposição e Maia se mantinha fora da Política, se dedicando a suas raízes religiosas. Tais nuances as tornam personagens ainda mais interessantes e universalizam suas histórias e conquistas.

Talvez, o xadrez seja muito mais Pop do que se imaginava, afinal de contas.

Veja a programação completa disponível aqui.
Serviço
17h Glória à Rainha
Dir. Tatia Skhirtladze/ Austria. Georgia, Sérvia, 2020, 82'.
Competição Internacional de Longas

Escrito por Petterson Costa

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