Eternos, de Chloé Zhao


O 26º filme do universo Marvel está chegando hoje aos cinemas e talvez ele não tenha sido feito pensando em agradar o jovem geek padrão, mas sim em atingir um público que há muito quer ver representatividade em produções de grande escala comercial como esta, afinal, sim o mundo é um lugar com inúmeras pessoas diferentes umas das outras e a classe de heróis não exatamente foi criada para ser perfeita e intocável, pelo contrário. 

Baseado nos quadrinhos escritos por Jack Kirby, em meados dos anos 70, os Eternos estão em missão na terra desde muito antes das civilizações contemporâneas e vieram com o intuito de proteger os humanos dos Deviantes. Criaturas criadas pelos celestiais que são animalescas e trazem caos e destruição. Logo que estes parecem ter sido derrotados, a lider do grupo, Ajak (Salma Hayek), os dá uma nova tarefa, achar um propósito e assim irem viver suas vidas fazendo o que bem desejarem. Depois de milianos, o grupo deve se juntar novamente, devido aos Deviantres recomeçarem a aparecer para perturbar a paz na terra.

A produção tem a cineasta Chloé Zhao na condução e a mesma assina o roteiro em parceria com  o trio Patrick Burleigh, Ryan Firpo e Kaz Firpo. O elenco é repleto de atores super conhecidos ou em ascenção. São eles, a já citada Salma Hayek, Angelina Jolie, Kit Harrington, Richard Madden, Kumail Nanjiani, Gemma Chan, Lia Mchugh, Brian Tyree Henry, Lauren Ridloff, Barry Keoghan, Ma Dong-seok, Harish Patel, Esai Daniel Cross, e Haaz Sleiman.  Além de dois grandes nomes que não foram creditados para evitar spoiler. 


Se Rick Riordan e J.K. Rowling e muitos outros escritores inseriram em suas histórias mitologias e personagens que conhecemos na aula de filosofia, fica claro que Kirby fez o mesmo (e talvez muito antes dos criadores de Percy Jackson e Harry Potter). Os protagonistas deste filme são apresentados ao público de forma única e a jornada do super grupo com nomes de deuses gregos e habilidades poderosissimas é a cereja do bolo.

Sprite, vivida por Lia Mchugh, dá vida a um ser infantil, quase andrógino, com cara de 'duende/fada' e nos remete aos contos ou histórias com seres encantados e malignos das florestas. No filme, tem sim super poder, mas não cresce e seu arco dramático está totalmente conectado a sua vontade de viver a vida intensamente (prepare lencinhos). Quem interpreta Druig é o irlandês Barry Keoghan (você pode tê-lo visto no impactante O Sacríficio do Cervo Sagrado, de Yorgos Lanthimos). Druig não necessariamente tem uma rota clara que o liga a mitologia em si, mas seu caminhar é potente e quando ele deixa o grupo para ir se aventurar pelo mundo, acaba vindo parar na Amazônia Colombiana e se conectando aos povos locais. O herói tem um ar de vilão maravilhoso, mas tudo pode ser ilusão. Ajak, a lider da turma, ganha vida com o trabalho de Salma Hayek. Se no filme, a personagem tem poder de cura como ponto forte, no quadrinho Ajak é homem e é arqueologo. Na mitologia, pode se dizer que esteja conectado a Ajax, um humano que só perde em força para Aquiles. Sersi, papel de Gemma Chan (Podres de Ricos e Capitã Marvel), é o paralelo de Circe nos tempos gregos. Bondosa, amorosa e poderosa, essa deusa tem forte conexão com a humanidade e acaba tendo um grande destaque no longa. O Deus Hefesto, conhecido por ser engenhoso e adorar forjar armas, pode ser espelhado em Phastos. Na produção, o personagem é um homem negro e gay e constrói uma família muito bonita. Brian Tyree Henry vive o primeiro herói LGBTQIA+ do MCU e não é nada caricato. 

Se o K-POP do BTS chegou com tudo, também é hora de termos heróis vindos da Coreia do Sul. Gilgamesh, interpretado por Ma Dong-seok (Invasão Zumbi), é este forte e acolhedor protetor. Sua essência está conectada a mitologia suméria e se permeia por um poema antigo da Mesopotâmia que se referia a um semideus. No filme, o personagem cria um forte laço de amizade e está sempre pronto para defender sua amiga (e talvez amor) Thena, a deusa da guerra. A mulher é vivida pela estonteante e talentosa Angelina Jolie. Mas o intrigante sobre ela é que, após tantas missões, se torna alguém quebrada e com traumas e é o caminho ao lado de Gilgamesh que a faz entender e lembrar da forte guerreira que é. Kingu é um Deus da mitologia babilônica que pode ser associado ao personagem do ator Kumail Nanjiani ''Kingo'' (o pratonista de Doentes de Amor está muito incrivel e não tem nada a ver somente com a sua transformação em crossfiteiro, sério). Kingo, é um homem forte e que encontra propósito ao se tornar uma estrela do cinema indiano e que anda para todo o lado com seu fiel assistente, Karun (Harish Patel) - alivio cômico da película. Kingo segue muito a liderança de Ikaris quando Ajak não está, mas as reviravoltas do enredo o mostrarão que o personagem baseado em 'Icaro', o Deus que ficou conhecido por voar muito perto do sol e perder as asas, vão além do que se mostra. Richard Madden (Game of Thrones) vive o herói que é apaixonado por Circe. O casal, aliás, não fica só nos olhares e manda vê na pegação e aparecem em cenas sutis fazendo sexo. Por último, temos a atriz Lauren Ridloff vivendo Makkari - que seria o Mercúrio da mitologia romana. Com velocidade sobre-humana, a heroína usa a lingua dos sinais para se comunicar e aparenta ter um relacionamento com o deveras intrigante Druig. Nos quadrinhos, Makkari é homem bem como Ajak e Sprite. E a alteração de gênero caiu muito bem para as três, aliás.


Um dos conflitos principais da trama gira em torno do tempo que os Eternos estão na terra esperando o fim da missão e seu novo chamado. Ademais, a questão do livre arbitrio para escolher ir contra as ordens que recebem chega a ser um divisor de águas para que eles conheçam quem realmente no grupo é amigo e quem não. Mesmo que a principio eles mostrem união e percebam que precisam trabalhar em conjunto por algo muito maior que eles. 

A todo o momento a existência humana e seus erros, muitas vezes irrevogáveis, serão relembrados, mas então entendemos o porquê dos heróis não poderem interferir em ações que não são deles, ''o custo é o aprendizado''. Inclusive, alguns deles vivem com humanos e até os namoram. E ainda assim encontram magia e beleza em uma vida comum e natural. 


É perceptível que o texto ergue a diversidade e a põe num altar. Portanto, não importa de onde você venha ou quem você seja, enaltecer suas origens é extremamente importante - para quem for assistir legendado ligue as anteninhas, os atores falam com seus sotaques originais e não tentam falar um inglês norte-americano comum dos filmes. Até Hayek consegue conservar sua latinidade ao hablar. Tanto quanto os irlandeses Madden e Keoghan. A conexão humana e o respeito são vistas profundamente aqui. Por sua vez, quando escutamos falas de traumas sentimos como se estes heróis fossem tão humanos quanto nós e é lindo entender que até super homens e super mulheres precisam se curar dos infortúnios que vivem. 

Trailer

Ficha Técnica
Título original e ano: Eternals, 2021. Direção: Chloé Zhao. Roteiro: Chloé Zhao, Patrick Burleigh, Ryan Firpo, Kaz Firpo - baseado na HQ escrita por Jack Kirby. Elenco: Angelina Jolie, Salma Hayek, Kit Harrington, Richard Madden, Kumail Nanjiani, Gemma Chan, Lia Mchugh, Brian Tyree Henry, Lauren Ridloff, Barry Keoghan, Ma Dong-seok, Harish Patel, Esai Daniel Cross, Haaz Sleiman, Harry Styles e Bill Skarsgärd. Gênero: Ação, drama, scifi, aventura. Nacionalidade: EUA, UK. Trilha Sonora Original: Ramin Djawadi. Fotografia: Ben Davis. Edição: Craig Wood e Dylan Tichenor. Distribuição: Marvel Brasil e Disney Studios. Duração: 2h37min.
Há quem vá dizer que Chloé Zhao enfrenta aqui a mão do estúdio, porém, o filme está simbólico demais para isso. Há sim um equilibrio enorme entre mensagens e concepção final e a diretora, usando técnicas reais, não precisou de CGI para humanizar nenhum dos heróis ou engrandecê-los para soarem mais 'padrões'. Naõ mesmo. Temos cenas de amor, amizade, homenagem ao cinema (Bollywood aparece lindamente aqui), um design de produção repleto de referências a séries clássicas de tevê (não fiquem enraivecidos whovians, tá legal, vai), ação e muita, muita compaixão pela beleza de ser verdadeiro. 

Podem tentar também dizer que a produção é longa, mas poxa, ela terá mais efeito do que certos filmes que prometem salvar o cinema por ai e só são chatos mesmo. Não Eternos. Não mesmo. Aliás, se você não se empolgar na abertura com 'Time' do Pink Floyd tocando, pode ser que você realmente não goste do divertimento consciente que este filme trás. 

Avaliação: Quatro
domos intergaláticas e meia viagem ao seu "eu" interior (4,5/5).

HOJE NOS CINEMAS

Escrito por Bárbara Kruczyński

    Comentários Blogger
    Comentários Facebook

0 comments:

Postar um comentário

Pode falar. Nós retribuímos os comentários e respondemos qualquer dúvida. :)