Me Tira Da Mira | Assista nos Cinemas


Este texto pode conter spoilers

Há um prato comum em muitos cardápios dos restaurantes que atrai uma leva enorme de pessoas: a Salada Caesar. Na sua forma mais básica, ela consiste em alface crespa, frango desfiado, pão, bacon e o molho Caesar. A partir desta composição, nutricionistas experientes talvez relatem que ''o alface, neste prato especificamente, seja somente uma desculpa para chama-lo de ''salada''. Saindo da cozinha e indo para a sala de cinema, a estreia desta quinta-feira, 24 de março, Me Tira Da Mira talvez se assemelhe ao que é uma ''Salada Ceasar''.  A película reúne a atriz e cantora Cleo, e os também atores e cantores Fiuk e Fábio Jr, além das influencers Viih Tube, Gkay e outras personalidades. A obra apresenta um o roteiro que não exatamente vislumbra um filme sério, e para os amantes da Ceasar Salad, é um pouco intragável se deliciar do prato quando a alface está amargando. Se torna intragável, inclusive.

Na trama, acompanhamos Roberta (Cleo), uma policial civil que é obrigada a buscar apoio psicológico após ser feita refém em uma ação policial. Ela, secretamente, usa essa oportunidade para investigar a Clinica Bianchinni de realinhamento energético, a qual ela suspeita que esteja por trás da morte da amada atriz Antuérpia Fox (Vera Fischer).

O MOLHO CHIEN

A direção de Hsu Chien (Quem vai ficar com Mário?), para bem ou para mal, está em todos os aspectos do filme. E ele mostra toda sua variedade. Tem momentos em que o longa aparentar ter um formato de drama policial, outros em que uma comédia romântica adolescente se faz presente, também um videoclipe, ou até mesmo uma esquete de humor, etc. Nada muito diferente do que fez em filmes anteriores, mas mostra uma certa evolução na parte técnica. Ao assistir a outros trabalhos seus, tem se a impressão de que Chien deixa os atores livres para improvisar, o que funciona quando você tem Julia Rabello interpretando a divertida 'Natasha Ferrero' e sua personalidade narcisista. Todavia quando se tem um elenco tão recheado de não atores como este, o tiro sai pela culatra mais vezes do que se pode  contar. O que resulta em piadas que poderiam ser engraçadas, mas ficam sem nenhum timming cômico e momentos constrangedores que miravam em um tom mais dramático. As cenas de ação são decentes em sua maioria, mas nada de tirar o fôlego. Inclusive, durante uma dessas cenas  o espectador pode até chegar a dar algumas risadas involuntárias a medida que estas revelam bandidos estúpidos, policiais mais estúpidos ainda, cenas calientes com um humor mais bem colocado, diria até excelente.
 
Em família, Fabio Jr., Cleo e Fiuk.
CLEO DESFIADA

Falando em policiais estúpidos, é assim que Roberta vê toda a corporação e especialmente Rodrigo, seu ex-namorado. Suas motivações e conflitos são literalmente ditos em sua sessão de terapia, porém, ela não os leva a sério

A escolha de apresentar essas várias motivações para no final não usar nada esvazia toda a atuação que Cleo consegue entregar aqui. A protagonista não muda, faz pouquíssimo esforço e no final nos deixa uma profunda antipatia. Todo esse absurdo poderia ser algo engraçado, mas a artista está no seu próprio filme de ação e o encara com seriedade, portanto, em momento algum se presta a esse ridículo. Aliás, é ela quem mais convence como policial civil e isto se deve muito mais a trabalhos anteriores do que da direção desse filme em si, então mérito dela.
 
Cleo tem a tarefa ingrata de ser a protagonista de um filme com vários não-atores, interpretando uma personagem dividida em várias motivações conflitantes e que chega ao ato final sem surpreender e não apresentando nada além de um desfecho repleto de clichês. Tudo que se salva são fiapos de ação e alguma troca divertida com Gkay, mas que se diluem no todo.
 
Cleo e e a influencer Gkay em cena do filme

O BACON DAS PARTICIPAÇÕES E PERSONAGENS SECUNDÁRIOS

As participações especiais são o grande chamariz desse filme e resultam em um pôster chamativo, mas em um filme que faz tudo menos isso.

Vera Fischer faz uma participação breve, mas que entrega o que precisa. O mesmo pode ser dito de Gkay e Silvero Pereira. A personagem de Julia Rabello em certo momento afirma ser a protagonista e o público pode até ter o desejo de que seja mesmo. Fiuk não faz muita coisa mas pelo menos não nos distrai. O mesmo não pode ser dito de seu pai, que não recebe nenhuma ajuda do roteiro, apenas faltando piscar para a câmera quando diz “almas gêmeas”.


AS TORRADAS DE AÇÃO

As cenas de ação são rápidas, cheias de tiros, socos e até temos uma grande explosão. Porém, seus personagens são tão estúpidos e desinteressantes que não existe qualquer tensão. São picotadas e tão espaçadas que acabam não dando textura ao filme. Apenas o suficiente pra colocar “ação” nas imagens de divulgação.
 
Cleo e Sergio Guizé em cena de ''Me Tira da Mira''
 
O ROTEIRO É UMA ALFACE AMARGA

Mas todas essas questões são pequenas perto do desastre que é este roteiro. O que não significa que seja obra de um único culpado. Temos dois roteiristas estreantes e vários revisores. Ainda assim, a produção é carregada de clichês ultrapassados e algumas vezes até ofensivos. Palavras como “cancelamento” são jogadas sem propósito no roteiro, numa tentativa constrangedora de se conectar com o público jovem.

A protagonista diz em certo momento ''que a morte de sua mãe a motivou a se tornar policial, que seu comportamento impulsivo e necessidade de se provar vem do pai superprotetor''. Em uma cena anterior, vemos que seu relacionamento com Rodrigo, personagem do ator Sérgio Guizé, acabou porque, na tentativa de salvar a vida dela, o homem a atrapalhou em seu trabalho.

Criando soluções, o roteiro teria duas rotas bem simples que poderia seguir: Ela poderia estar certa, todos a atrapalham o tempo todo e seu pai superprotetor a impede de crescer e seu arco poderia se tratar de mostrar como todos estavam errados em subestima-la. Ou ela poderia estar errada, seu orgulho a impede de ver que todos acreditam nela e seu arco poderia ser aprender a aceitar ajuda.

Qual foi a linha narrativa escolhida? As duas. O texto falado diz algo, as ações dos personagens o contradizem sem qualquer objetivo dramático. Por exemplo, a cena em que Rodrigo “a atrapalha” deixa óbvio que ele a salvou. E em momento nenhum isso é trazido à tona. A questão do pai superprotetor e da mãe como motivação pra entrar na polícia? Ela deixa a polícia civil, assume um cargo internacional que não é nomeado e o conflito não é resolvido. 
 
O figurino da produção dá ao elenco muito estilo
 
O único conflito realmente resolvido ao final é seu romance, pois Rodrigo a salva mais uma vez, só que a oportunidade não resulta em mais um incidente no trabalho de Roberta. E pode ser a cena divirta horrores a plateia, pois o casal começa a trocar beijos durante o tiroteio e para surpresa de ninguém, Rodrigo é baleado durante o ato.
Trailer
 

Ficha Técnica
 
Título original e ano: Me Tira da Mira, 2022. Direção: Hsu Chien Roteiro: Claudio Simões, Beatriz Rhaddour. Elenco: Cléo, Fiuk, Sergio Guizé, Fábio Jr, Vera Fischer, Bruna Ciocca, Júlia Rabello, Silvero Pereira, Maria Gladys, Kaysar Dadour, Cris Vianna, Stênio Garcia, Adriana Birolli, Viih Tube, Gessica Kayane, Vilma Melo, Mel Maia. Gênero: Comédia, ação. Nacionalidade: Brasil. Trilha Sonora Original: Daniel Simitan, Dan Araújo, Diego Timbó. Fotografia:.Daniel Primo. Edição: Leonardo Gouvea. Distribuição: Imagem Filmes. Duração:1h30min.

Fãs do elenco claramente vão se sentir tentados a conferir a produção. Por fim, se o público conseguir digerir o roteiro amargo, os outros ingredientes dessa salada podem talvez serem agradáveis. No entanto, não deixem de notar também os outros trabalhos incríveis que Sergio Guizé, Silvero Pereira ou Cleo tem por ai. Ademais, 'Me Tira Da Mira'' soa mais como um roteiro para um ótimo videoclipe, uma live ou festa, pois o molho, o frango, o bacon e o pão não deixam de ser um bom lanche, mas as vezes é melhor retirar alface que passou do ponto.

HOJE NOS CINEMAS

Escrito por Igor Rocha

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