terça-feira, 19 de agosto de 2025

Luiz Gonzaga - Légua Tirana, de Diogo Fontes e Marcos Carvalho

 
Em 1912 nasce no agreste de Pernambuco Luiz Gonzaga do Nascimento, filho do meio de uma família humilde da zona rural de povoado de Araripe. O menino viria a se tornar o Rei do Baião, eternizando no cenário da música popular brasileira ritmos como o xote e o forró pé de serra. Temos então uma cinebiografia musical de mais um ícone da música nacional.

A maior parte das cinebiografias falham no mesmo aspecto comum: o excesso de informações na tentativa de compilar, no tempo de duração de um longa metragem, a vida inteira de uma pessoa sem prejudicar a coesão da narrativa. Muitas vezes ocorrem falhas que acabam por dar a esse tipo de filme o efeito contrário: muitas informações em pouco tempo, sem o devido aprofundamento. A sensação é a de ler um livro pulando de 10 em 10 páginas, tendo que deduzir o que ocorreu no meio tempo.

Em Légua Tirana, o foco está nas raízes do músico. A infância difícil junto à família e o sonho de se tornar um artista, permeiam a narrativa. O pai de Luiz, Januário José dos Santos (vivido por Luiz Carlos Vasconcelos) é um sanfoneiro conhecido na região e está sempre incentivando o filho a aprender a tocar instrumentos e abraçar sua paixão pela música, enquanto a mãe, Dona Santana (papel de Claudia Ohana), tem uma postura mais rígida e teme pelo que possa acontecer ao filho caso ele se lance ao mundo. Essa diferença na personalidade dos pais cria um contraste interessante de pontos de vista e constitui um dilema central da película com o qual o roteiro tem muito o que trabalhar.

A direção de Diogo Fontes e Marcos Carvalho desenvolve com muita paciência os personagens e seus conflitos, enfatizando a vida cotidiana no sertão. Temas muito caros como a desigualdade social, a religiosidade como forma de refúgio e o apelo à autoridade aparecem na tela de forma palpável e retratam um recorte histórico do Brasil daqueles tempos (e quiçá também do atual). Sem poder estudar para não prejudicar a renda da família, o pequeno Luiz, em uma interpretação fantástica de Kayro Oliveira, é obrigado a trabalhar e sofre seus perrengues na mão de adultos. Mesmo com os percalços, o jovem não se deixa abater e leva a vida com muito humor, astúcia e coragem.

Nesse sentido, o filme acerta em cheio ao retratar a resiliência do povo nordestino representado na figura de Gonzaga. Há muitas cenas introspectivas onde Luiz é colocado em uma espécie de "transe", ou cenário de sonho, e guiado espiritualmente para seu destino inevitável. Essas cenas, artisticamente falando, são a representação de seu amadurecimento. “O mundo é de quem tem coragem”, repetem. É a personificação em tela da figura do retirante, pessoa que sai de sua terra natal para tentar prosperar em outro lugar, fugindo da fome, da seca, seguindo sua légua tirana. No caso de Luiz a sua légua tirana é um chamado, quase vocacional, divino para trazer alegria aos brasileiros sem jamais esquecer suas raízes.

                                                                           Crédito de Imagens: O2 Play Filmes
O longa foi rodado na Chapada do Araripe, divisa de Pernambuco, Ceará e Piauí, e  também em Caiçara, na Paraíba

Na fase de jovem adulto (interpretado por Wellington Lugo) vemos Luiz vivendo o primeiro amor e experimentando as primeiras desilusões. Ele começa a fazer dinheiro com a sanfona e vai ganhando notoriedade aos poucos. É nesse ponto da vida que ele então vira a chave e se lança ao mundo para tornar-se o que nasceu pra ser: um artista. Esses momentos de autopercepção estão sempre associados com forças espirituais simbólicas.

Já na fase adulta, interpretado novamente por Chambinho do Acordeon (ele já interpretou Luiz Gonzaga no filme “Gonzaga: de pai para Filho”, de Breno Silveira, lançado em 2012), o vemos retornando para a casa após ganhar fama e reencontrando os pais, cumprindo, enfim, o seu chamado. Nesse ponto talvez haja uma perda de intensidade no texto, porém a narrativa se mantém fiel a ser algo sobre família e legado. O longa se sedimenta, então, como uma homenagem à audácia de um homem e sua relação intensa com suas origens.

Apoiada em uma narrativa que se desenvolve sem pressa, a produção cria momentos leves, mas sem abrir mão da crítica e do comentário social, ressaltando a importância da jornada na formação de um artista.

Trailer



Ficha Técnica
Título original: Luiz Gonzaga – Légua Tirana, 2025. Direção: Diogo Fontes e Marcos Carvalho. Roteiro: Tairone Feitora, Diogo Fontes e Edneia Campos. Elenco: Kayro Oliveira, Luiz Carlos Vasconcelos, Cláudia Ohana, Tonico Pereira,Chambinho do Acordeon. Gênero: Biografia, Drama. Nacionalidade: Brasil. Produção: Mont Serrat Filmes e Cinema no Interior. Animação: Carlos Sarmento. Distribuidora: O2 Play Filmes. Duração: 1h 54min. Formato / resolução: 4K. Áudio: 5.1. Classificação indicativa: a partir de 14 anos.

Luiz Gonzaga faleceu em 1989, deixando um imenso legado musical.

21 de Agosto nos Cinemas

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