"Eu sou Severino Cavalcanti do Regô Barros"
Em tempos em que a sociedade já não possui tantos exemplos de homens inspiradores, surge o retrato ficcional e documental de um senhor de idade, nos seus noventa e tantos anos (o filme refaz algumas de suas festas de aniversário ao fim da película), dotado de muita lucidez e que encanta quem se permite ir assistir esta estória nas telas. “Seu Cavalcanti”, recorte de quase duas décadas feito pelo cineasta Leonardo Lacca sobre seu avô, contou com pré-estreias especiais em São Paulo e Recife, no início de setembro. Agora, com a agenda do Cine Brasília menos tomada por eventos tão glamorosos quanto o Festival de Brasília, o filme ganha espaço na programação - e o primor e o valor da obra certamente merecem a atenção do público brasiliense, especialmente daqueles que chegaram à cidade para construí-la de peito aberto. Talvez não de todos, afinal, a população evangélica bolsonarista na capital é grande. No filme, vovô Cavalcanti demonstra respeito à Presidenta Dilma em certa cena, e, talvez, esse momento afaste o público citado das salas - mas não farão falta.
Lacca narra o filme com um sotaque recifense gostoso de se ouvir, pela calma e pela variação de tons que preenche sua voz a cada mensagem que deseja transmitir. O avô é um homem cheio de vida. Usa seu Fiat Uno velhinho e sai dirigindo por aí, enquanto o narrador revela preocupação com tal atitude desmedida, já que o avô não é um bom motorista. Nos primeiros momentos do filme, vemos Seu Cavalcanti na cama, saindo para ir ao barbeiro e também sendo o mais atrasado a chegar à festa de formatura da neta. Policial civil aposentado, o senhor vai ao médico e, mesmo tendo o carro roubado, continua sagaz e com o coração pulsando no compasso certo. O carro levado, logo o recupera e decide comemorar com sua bebida predileta: o uísque. Exalta o trabalho da polícia, conta sobre seu tempo na corporação e, quando reencontra o veículo, a primeira ação que toma é verificar se seus sabonetes ainda estão no porta-luvas. Que figura!
Os minutos finais do docuficção misturam o andar cheio de estilo de Cavalcanti a imagens de cachorros ou outras ainda mais dinâmicas que o fazem ficar em movimento dentro do vídeo. Um meme vivo. Eterno. Suas filhas, netos, amigas e relações ficticías entregam bons encontros, conversas e um certo desconcerto, após a morte do homem. Mas quem proporciona isto é a câmera que apresenta um ângulo torto, após uma vizinha presente no recinto, alterar sem querer a posição dada ao objeto pelo diretor.
Seu Cavalcanti é uma obra que soma. Uma história que nos eleva. Ademais, é bem filmado, cheio de inventividades aqui e alo e sem medo de ser boicotado pela fora e idéias que apresentam.
© Cajuína Audiovisual, Plano 9, Trincheira Filmes, Cinemascópio24
O amor de Seu Cavalcanti por uma bebida especifica faz o diretor se expressar: " Esse filme devia ter patrocínio de Uísque " . E não há como discordar.
O roteiro permite que as mudanças fluam, que o personagem central tenha tempo para apreciar, para rever os problemas e, enfim, para partir. Sua maneira de falar baixo talvez tenha motivado o diretor a levá-lo, de forma carinhosa, a um estúdio para regravar falas e explicar certas atitudes de Seu Cavalcanti. Temos cor, temos um áudio de excelente qualidade, e nada no filme se torna cansativo. Suas poucas horinhas dizem muito ao coração, à família e, talvez, àqueles que nunca tiveram uma figura paterna na vida. Uma verdadeira ode a tudo isso.
A atriz Maeve Jenkins (Aquarius, Kléber Mendonça Filho) e Tânia Maria (Bacura e O Agente Secreto, Kléber Mendonçca Filho) fazem participações eventuais. Ambos os arcos são ficticios, exceto que Jenkins tenha se tornada amiga de Seu Cavalcanti e retrata um pouco desta amizade faceira. Ademais, o filme tem produção de Emilie Lesclaux, Kleber Mendonça Filho, e Leonardo Lacca.
Trailer
Ficha Técnica
Título Original e Ano: Seu Cavalcanti, 2024. Direção e Roteiro: Leonardo Lacca. Elenco: Severino Cavalcanti, Tereza Cavalcanti, Isabel Novaes, Maeve Jinkings, Tânia Maria, Jácylla Kenya, Leonardo Cavalcanti. Nacionalidade: Brasil. Gênero: Documentário, Ficção. Montagem: Ricardo Pretti, Luiz Pretti. Fotografia: Leonardo Lacca, Pedro Sotero. Som: Marina Silva, Carlos Montenegro, Roberto Espinoza, Nicolas Hallet, Tião. Trilha Sonora: Tomaz Alves Souza. Produção: Emilie Lesclaux, Kleber Mendonça Filho, Leonardo Lacca, Mannu Costa. Empresas Produtoras: Trincheira Filmes, Cinemascópio, Plano 9. Distribuição: Cajuína Audiovisual. Duração: 78 minutos.
Com uma direção emotiva, cercada de afeto e muito talento, "Seu Cavalcanti" entrega ternura e quem sabe já um formato de se fazer cinema a ser perpetuado. Contando verdade, mas nem todas as vezes. Afinal, quem aceita se evidenciar, pode muito bem trazer polêmicas e outras reuniões que o farão ter menos veracidade.
ESTRÉIA NO CINE BRASILIA
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