quarta-feira, 27 de agosto de 2025

C.I.C. - Central de Inteligência Cearense, de Halder Gomes


A C.I.C. é uma agência governamental secreta onde atua Wanderley, vulgo Karkará, vivido por Edmilson Filho. Ele é designado para uma missão “super-hiper-mega-ultra secreta”, encarregado de salvar o Brasil de uma ameaça misteriosa após a morte de um cientista nacional que trabalhava em um projeto tão enigmático que nem mesmo a própria agência sabe exatamente do que se trata. Essa é a premissa de C.I.C. – Central de Inteligência Cearense, uma comédia brasileira escrachada e absurdista, sem qualquer compromisso com a seriedade.

O estado do Ceará tem no humor um patrimônio turístico identitário. Essa construção social da comédia cearense como algo marcante da cultura de um povo passa pelos eventos ocorridos na Praça do Ferreira, onde se popularizaram as famosas vaias cearenses e também o hábito de se reunir em grupos para contar as patotas (mentiras absurdas) no dia primeiro de abril. Por exemplo, em 1922 como forma de protesto pela corrupção e desigualdade, um bode chamado "Ioiô" foi eleito vereador na cidade de Fortaleza e virou uma celebridade. Esses eventos inusitados são a prova de que a manifestação do humor não é apenas vão entretenimento, mas esteve presente em protestos e na construção da história da cidade de Fortaleza e do estado do Ceará. 

                                  Crédito de Imagens: Paris Filmes / Divulgação
Halder Gomes e Edmilson Filho já são parceiros de longa data e trabalham juntos mais vez


Dentro desse contexto sociocultural, o filme não tem receio de colocar seus personagens em situações ridículas e rir de si mesmo, abraçando as cenas de luta mais insanas e inusitadas possíveis. Os diálogos são afiados e traduzem bem a irreverência e a alegria do povo brasileiro. Lutas em cima de um avião em pleno voo se transformam em um verdadeiro deleite do absurdo — afinal, quem se importa com a lei da gravidade? Nesse espírito, a direção de Halder Gomes entrega uma explosão de ação, com mãos biônicas, óculos ultrapotentes e golpes acompanhados por aquele barulho clássico de soco que parece saído direto de um desenho animado. Já a fotografia contrasta com o tom escrachado do roteiro ao oferecer visuais exuberantes do Ceará, conferindo escala continental e agregando beleza à narrativa.

Por falar em escala, apesar de ser uma trama brasileira, o longa surpreende ao colocar boa parte de seu elenco falando em espanhol, ou um portunhol enrolado. Temos aqui uma equipe que conta com o agente Karkará, o agente paraguaio e uma agente argentina trabalhando juntos para derrotar a organização criminosa chamada R.O.L.A. chefiada pela misteriosa Koorola (vivida por Tóia Ferraz). A vilã ainda conta com um brutamontes com corpo robótico, um exterminador do futuro à la Brasil. E para chocar um total de zero pessoas, o roteiro cria situações para alimentar a famosa rivalidade entre Brasil e Argentina sempre com muito humor e descontração. O agente paraguaio Romerito, vivido por Gustavo Falcão, está sempre na cola de Karkará e funciona como personagem de apoio. Enquanto Mikaela, vivida por Alana Ferri, a agente argentina, é o interesse romântico de Wanderley. 

As cenas na sede da C.I.C. tem o núcleo do chefe pragmático e terrivelmente fumante, que ironicamente se chama Espírito Santo (vivido por Nill Marcondes) e sua assistente de cabelo colorido, Divina (interpretada por Monique Hortolani) que é a nerd do grupo. A química da dupla se completa com a Inteligência Artificial da agência, Mazé - interpretada por Karla Karenina - que está sempre disposta a fazer comentários inconvenientes e constranger o protagonista. O algoritmo pode realmente ser muito divertido e até mesmo soltar uma vaia cearense no meio de suas piadas e comentários maldosos. A inserção de uma IA ácida e irônica foi uma sacada muito inteligente e deixou o filme ainda mais divertido. De forma geral, a interação do trio da C.I.C. com Wanderley sempre rende bons momentos e faz sátira dos clássicos filmes de espiões com escritórios de visuais ultra futuristas.

Trailer



Ficha Técnica 

Título Original e Ano: C.I.C - Central de Inteligência Cearense, 2025. Direção: Halder Gomes. Roteiro: Marcio Wilson. História Original: Edmilson FilhoElenco: Edmilson Filho, Alana Ferri, Tóia Ferraz, Gustavo Falcão, Nill Marcondes, Monique Hortolani, André Segatti e Valéria Vitoriano. Gênero: Comédia. Nacionalidade: Brasil. Direção de Fotografia: Carina Sanginitto. Direção de Arte: Juliana Ribeiro. Figurino: Chris Garrido. Caracterização: Emi Sato. Direção de Produção: Dayane QueirozSom Direto: Márcio Câmara. Edição de Som e Mixagem: Érico Paiva Sapão. Montagem: Helgi Thor. Trilha Sonora Original: Herlon Robson Braz. Produção de Elenco: Monice Mendes. Produção Executiva: Patricia Baía upex, Mariana Marcondes upex. Produzido por: Marcio Fraccaroli, Andre Fraccaroli, Veronica Stumpf. Produção Associada: Rodrigo Castellar, Adrien Muselet. Produção: Paris Entretenimento. Coprodução: Globo Filmes e Globoplay. Patrocínio: ECOTEC Brasil, Cajuína São Geraldo. Apoio: FSA/BRDE/Ancine. Apoio Cultural: Jaguaríndia Village, Jaguaribe Lodge & Kite. Distribuição: Paris Filmes. Duração: 01h41min. 14 anos

Em algumas cenas a sonoplastia fica prejudicada, mas nada que atrapalhe a experiência geral. Muitas vezes isso até mesmo contribui para o clima tresloucado da narrativa. O timing cômico também nem sempre tem o ritmo necessário, mas não chega a arruinar a imersão. Mesmo sendo irregular nesses aspectos, a produção consegue entregar o necessário para que a maioria das piadas funcionem em tela.

Embalado pelo contexto social e cultural do humor como patrimônio cultural cearense, o texto usa comédia escrachada para construir uma trama divertida de acompanhar, com diálogos afiados e atores que parecem se divertir enquanto atuam. C.I.C. é uma comédia que faz ode a uma cultura e também a amizade e pacifismo dos países da América Latina. Divertido de acompanhar, provavelmente vai arrancar muitas risadas nervosas para quem for fã do humor do absurdo.

28 de Agosto nos Cinemas

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