A Fera, de Baltasar Kormákur


Baltasar Kormákur é um diretor islandês com alguma experiência no gênero (hoje em certa baixa) do homem contra a natureza com filmes como Everest (de 2015 com Josh Brolin e Jake Gyllenhaal sobre um grupo tentando subir ao pico mais alto do mundo - leia texto aqui) e Vidas à Deriva (de 2018 com Shailene Woodley e Sam Claflin, uma história real sobre um casal que naufraga um pequeno veleiro). O gênero teve uma época de alta nos anos 90 em que a “natureza” se mostra de diversas formas, da mais espetacular como os asteroides de Impacto Profundo e Armageddon ambos de 1998, quanto da mais corriqueira como os tornados em Twister.

Jon de Bont, diretor do último filme citado, também dirigiu Velocidade Máxima, onde os protagonistas também lutavam contra uma força imparável, desta vez um ônibus sequestrado por um terrorista. Mesmo não sendo um evento natural, o ônibus funciona com as mesmas funções narrativas, ou seja, ocupa um lugar de evento crítico catastrófico que deve ser superado pela humanidade de seus protagonistas.

É nesse terreno de filmes que colocam suas personagens contra forças da natureza que se encontra A Fera, estrelado por Idris Elba e lançado esta semana. No filme, o médico americano Nate leva suas filhas (Iyana Halley e Leah Jeffries) à África para conhecerem a terra natal da falecida mãe e fazerem um safári com Martin (Sharlto Copley), um grande amigo da família e um dos biólogos da reserva ambiental. Lá, eles descobrem muitas vítimas mortas por leões, mas com características incomuns para o animal: os mortos são muitos e não viram alimento. A natureza se mostra muito mais implacável.


Assim, seguimos Nate, as filhas Mare e Norah conhecendo a savana com Martin até eles mesmos se tornarem os alvos desse leão que os caça incansavelmente. Até chegarmos na ação propriamente dita, o filme nos mostra os clássicos dramas pessoais de seus personagens que passam pelo luto coletivo pela mãe das garotas e ex-esposa de Nate e o distanciamento de um pai solo de suas filhas adolescentes. Mesmo acrescentando pouco à narrativa principal, esses momentos são importantes porque deixam a impressão de que o filme tenta se pautar em sensações comuns, finca os pés no chão na hora de construir as bases com as quais nos mostrará com qual lente assisti-lo. Num tempo em que o único cinema comercialmente viável se inscreve quase exclusivamente no gênero de super-heróis e fantasia, A Fera se mostra muito bem vindo por elaborar conscientemente uma narrativa mundana. Claro que com alguns momentos de suspensão da descrença (o famoso “ô mentira!"), importantes desde o início da narrativa cinematográfica e um elemento fantasioso que torna a experiência do cinema de ficção tão cativante.


Sem o elemento sobrenatural de poderes, magia, super-inteligência, super-gadgets ou habilidades especiais (como o John Wick que dizem ser um personagem humano), existe a segurança de que vamos sentir o drama dos problemas e o peso das escolhas como sentiríamos caso estivéssemos ali. Há pouco espaço para deus ex machina (é quando uma figura chega para resolver os problemas da narrativa de forma mágica) porque o filme tenta espalhar suas iscas de resolução por toda a duração e pautados de certa forma na ciência — afinal não é a toa que Nate é médico.

Existe ainda um certo discurso ambiental contra a caça ilegal de animais silvestres que passa batido, mas cumpre seu papel, seja em prol do suspense quanto nas justificativas dos pontos de virada. Infelizmente, nada que dê grandes fôlegos a produção e, assim como a escolha de ser um filme “pé no chão”, existe e é melhor que esteja assim por todo seu desenvolvimento, todavia não auxilia a narrativa a nos colocar contra o assento do cinema nas cenas que deveriam ser mais dramáticas. 

A Fera é, portanto, um bom respiro à fórmula de ação engessada que parece inescapável em Hollywood na última década e deve ser elogiado por isso. Aliado à curta duração de 93 minutos, o filme de Kormákur é um produto para relaxar por alguns momentos depois de um passeio com a família no shopping, mas não deixará muitas memórias além disso.

Trailer


Ficha Técnica
Título original e ano: Beast, 2022. Direção: Baltasar Kormákur. Roteiro: Ryan Engle e Jaime Primak Sullivan. Elenco: Idris Elba, Sharlto Copley, Iyana Halley, Leah Jeffries, Mel Jarnson, Anzor Alem, Billy Gallagher, Dorian Hedgewood, Kate Grisley, Travis Lemrick, Robby MacIsaac, Damon Burtley, Hudson Anne-Black. Gênero: Aventura, drama, horror. Nacionalidade: Estados Unidos da América. Trilha Sonora Original: Steven Pryce. FigurinoMoira Anne Meyer. Design de Produção: Jean-Vincent Puzos. Distribuição: Universal Pictures Brasil. Duração: 01h33min.

11 de Agosto nos Cinemas

Escrito por Marisa Arraes

    Comentários Blogger
    Comentários Facebook

0 comments:

Postar um comentário

Pode falar. Nós retribuímos os comentários e respondemos qualquer dúvida. :)