Blue Jean, de Georgia Oakley | Assista nos Cinemas


O amor sáfico no cinema é subaproveitado, pouco volumoso e, quando retratado, rende-se a estereótipos como o da adolescente confusa vivendo a vida intensamente ou entra em estatísticas como a que diz que a maioria dos filmes LGBTQIAPN+ possuem um final trágico para seus protagonistas.

Só de não seguir por esse rumo, Blue Jean já é notável. Outro fato louvável é o de que a obra é escrita e dirigida por uma mulher, a estreante Georgia Oakley, e possui a produção inteiramente nas mãos do gênero feminino. Isso evita que o filme caia em armadilhas como a do male gaze - como em de Azul é a cor mais quente (Abdellatif Kechiche, 2013) - ou a de retratar o romance lésbico como se fosse uma amizade qualquer, como em Tomates Verdes Fritos (Jon Avnet, 1991). 

Outro benefício fruto da colaboração de Oakley com sua equipe é a retratação de uma feminilidade plural. Da protagonista (Rosy McEwen), ao elenco de apoio, vários corpos não-padrões recebem tempo de tela e vemos também algumas variações de performance da sexualidade lésbica. A narrativa retrata a professora de educação física Jean, que leciona em uma grande escola. Jean vem de uma separação de um casamento heterossexual e, apesar de muito consciente de sua sexualidade, ainda não sente-se segura para assumi-la para o mundo.

É importante ressaltar que a história se passa na Inglaterra da década de 1980, onde a política de Margareth Thatcher não pretende facilitar a vida dos homossexuais com suas propostas conservadoras. A década também foi marcada pela epidemia da AIDS, o que gerava ainda mais estigma para essa população. É perspicaz como o filme aponta isso sem precisar abordar o tema, apenas introduzindo um cartaz governamental que alerta para o perigo da doença.

                                                                                                                        Créditos: Divulgação 
Blue Jean passou por inúmeros festivais, inclusive, o Festival do Rio (2022). Na sua jornada de premiações já levou 24 indicações e em 12 delas foi premiada. No Festival de Cinema de Veneza, a película ganhou o voto popular.

Jean vê sua incognitude ameaçada quando uma nova aluna (Lucy Halliday) entra em sua turma e passa a frequentar o mesmo pub sáfico que ela. Naturalmente, surge um interesse de uma sobre a outra. Mas aos poucos percebemos que os closes nos olhares e bocas das duas - que pareciam indicar desejo - demonstram uma necessidade de se reconhecer em outra pessoa.

A adolescente Lois vê um futuro. Uma mulher adulta com um emprego estável que tem uma namorada e se diverte em um bar nichado. E Jean vê a adolescente que ela foi - deslocada, preterida - mas também a adolescente que ela poderia ter sido, uma muito mais segura de si e mais convicta de quem é.

O medo de ser exposta no emprego como quem realmente é faz Jean tomar atitudes desmedidas que dividem o espectador entre compreender o sofrimento emocional dessa mulher e julgar suas condutas covardes e injustas. Em determinada cena, a protagonista aceita sair com os colegas de trabalho preconceituosos pela primeira vez. Ela se esforça para se divertir com eles e tolera as investidas cheias de segundas intenções de um conhecido. Atrás dela, camuflada como uma decoração do bar, uma seta vermelha luminosa pisca impiedosamente para a direita, como se aquele lugar lhe indicasse o caminho que ela deve tomar nesse momento de guinada.
 
                                                                                                                                                   Créditos: Divulgação
Com produção do BFI Film Fund, BBC Film, Kleio Film em associação com a Great Point Media, Blue Jean chegou ao Brasil com distribuição da Synapse Distribuition.

Mas se o filme, tem belos momentos de simbologia, também há aqueles que são péssimos. Concentrados no terço final da trama, eles se amontoam e dão uma carga melodramática ao longa-metragem que até agora ia tão bem. É constrangedora ao nível de parecer que é uma paródia a cena em que Jean se liberta de um peso que vinha carregando e então sai correndo para o lado de fora com um sorriso no rosto e observa cavalos trotando em liberdade.

Por mais que haja esse declínio no final, ainda vale a pena conferir a construção dessa personagem tão rica e complexa quanto Jean, sem falar nas complexidades presentes também em Lois e Viv (Kerrie Hayes). Apesar de não ter um final trágico, a obra é bastante realista no sentido de que, na vida, umas coisas se consertam, outras desandam. Nada é bom o tempo todo. Então, preparem os lencinhos.

Trailer


Ficha Técnica 
Título original e ano: Blue Jean, 2023. Direção e roteiro: Georgia Oakley. Elenco: Rosy McEwen, Lucy Halliday, Kerrie Hayes, Lydia Page, Aoife Kennan. Gênero: Drama. Nacionalidade: Reino Unido. Fotografia: Victor Seguin. Edição: Izabella Cury. Direção de Arte: Soraya Gilanni. Trilha Sonora Original: Chris Roe. Supervisão de Som: James Mather Produtoras: Hélène Sifre e Marie-Elena Dyche. Produtores Executivos: Jim Reeve e Eva Yates Distribuição: Duração: 97 minutos. 

A produção estreia hoje, 27 de julho, nos cinemas de Brasília, Goiânia, Recife, Salvador e Porto Alegre.

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Escrito por Luana Rosa

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