Emily


"A coisa mais maravilhosa que existe é amar e ser amado’, eu li isso nalgum lugar”!

A atriz de ascendência britânica Frances O’Connor é acostumada aos papéis de época, tendo sido indicada e premiada por alguns deles. Em suas interpretações, ela recorrentemente percebeu-se frente aos dilemas de mulheres socialmente julgadas por causa de anseios românticos e, sobretudo, pela audácia em desafiar as convenções repressoras dos ambientes em que viveram. Sendo assim, é bastante compreensível que ela tenha estreado como diretora adaptando a história de vida de uma escritora sumamente influente, em âmbito póstumo. A aclamada Emily Brontë [1818-1848].


Responsável pelo célebre romance “O Morro dos Ventos Uivantes” – único de sua carreira, publicado um ano antes de sua morte, em 1847, sob pseudônimo –, Emily Brontë foi precedida na literatura por sua irmã mais velha, Charlotte [1816-1855], que publicou o clássico “Jane Eyre”, também em 1847. O caráter assustador dos cenários em que se passam ambas as tramas faz com que imaginemos as condições austeras em que estas irmãs viveram, visto que elas eram filhas de um homem bastante rígido, além de terem ficado órfãs de mãe muito cedo. E esse é justamente o porto de partida do longa-metragem “Emily”…

Aqui, a escritora é interpretada pela promissora Emma Mackey, enquanto sua irmã igualmente famosa é vivida por Alexandra Dowling. A família de jovens escritores é completada pela caçula Anne (Amelia Gething) e pelo impetuoso Branwell (Fionn Whitehead). Cada um deles escreveu poemas e algumas tentativas literárias, mas o roteiro, escrito pela própria diretora, enfatiza uma suposta rivalidade entre Emily e Charlotte. De acordo com o filme, isso interfere nas composições dos personagens de ambas as autoras. 

Créditos: Divulgação        

A atriz inglesa Emma Mackey vive a escritora que encantou o mundo com seu romance gótico ''O Morro dos Ventos Uivantes''.

No início, vemos Emily desfalecendo, quando “O Morro dos Ventos Uivantes” já havia sido publicado. Notamos uma reação iracunda, por parte de Charlotte, até que compreendemos, em ‘flashback’, o que acontecera até ali: por ser a mais velha, Charlotte é educada para ser professora, na Bélgica, vocação esta que, para o patriarca da família, Patrick (Adrian Dunbar), também deveria ser seguida pelas demais filhas. Emily não concorda com isso, entretanto. Deseja ser livre, o que é estimulado pela convivência freqüente com seu irmão Branwell, que advoga em prol da liberdade de pensamento. Um amor proibido interromperá (ou melhor, ressignificará) este anseio…

Ao conhecer o reverendo William Weightman (Oliver Jackson-Cohen), Emily o trata com repúdio, inicialmente, mas logo se perceberá apaixonada. Seu irmão, progressivamente inclinado aos vícios em substâncias como gim ou ópio, estimula Emily a experimentar o amor, mas, quando isso ocorre, ele incomoda-se ao constatar que esse sentimento, em vez de tornar a sua irmã mais prolífica, pode torná-la uma mulher langorosa. É quando o destino intervém de maneira fatal, fazendo com que a geniosa e inteligente Emily fique à mercê dos caprichos de três homens: um pai intransigente, um amante reprimido e um irmão inconseqüente. Pretextos ideais para um libelo feminista, não é?


Créditos: Divulgação      
Em 1946, Curtis Bernhardt dirigiriu ''Devotion''. O filme apresentava enredo focado na vida das irmãs Brontë.


Ainda que a diretora e roteirista simplifique em excesso eventos e personagens reais, as situações vivenciadas por Emily Brontë, em sua breve mais fulgurante vida, servem como estímulos positivos para as pulsões identitárias das espectadoras que se identificam com ela. Com uma imaginação sobremaneira fértil, Emily ousa dizer “não” pra determinações impositivas de seus parentes, como as exigências comportamentais de uma tia idosa (Gemma Jones), que tenta convertê-la numa dona-de-casa tradicional. Ela prefere correr na chuva, o que acontece mais de uma vez ao longo do filme, e que talvez tenha sido o motivo da tuberculose que ceifou precocemente a sua vida. A vida das irmãs Brontë foi romanesca por excelência!

Fotografado de maneira esmerada por Nanu Segal e pomposamente musicado por Abel Korzeniowski, “Emily” é um filme que equivoca-se na abordagem um tanto pueril do relacionamento entre a protagonista e seu irmão, na intensificação de um rancor entre ela e a sua irmã Charlotte e na obliteração de algumas informações sobre as condições de publicação das obras das escritoras [“Jane Eyre”, por exemplo, foi lançado antes de “O Morro dos Ventos Uivantes”, e de maneira bem-sucedida]. Para quem leu os romances supracitados, há um charme inequívoco em comparar aquilo que é mostrado no filme ao que imaginamos sobre o cotidiano das autoras, a ponto de ter interferido em suas obsessões literárias, fortemente influenciadas pela lugubridade da poesia de Lord Byron [1788-1824], como era típico desse período. É uma produção simpática, não obstante incorrer na inspiração preguiçosa de que Emily acusa o seu irmão. Mas entretém! 

 

Trailer

 

Ficha Técnica

  • Título original e ano: Emily, 2022. Direção e Roteiro: Francis O'Connor. Elenco: Emma Mackey, Oliver Jackson-Cohen, Fionn Whitehead, Alexandra Dowling, Amelia Gething, Adrian Dunbar, Gemma Jones,  Veronica Roberts, Gerald Lepkowski, Cara Foley. Gênero: Romance, Drama, Biografia. Nacionalidade: Reino Unido e Estados Unidos da América. Trilha Sonora Original: Abel Korzeniowski. Fotografia: Nanu Segal. Edição: Sam Sneade. Direção de Arte: Jono Moles.  Figurino: Michael O'Connor. Distribuidora: Imagem Filmes. Duração:  02h10min.
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Escrito por Wesley Pereira de Castro

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