Era Uma Vez Um Gênio, de George Miller

Em 2015, o cineasta australiano George Miller conseguiu conquistar público e crítica com seu insano, grandioso e frenético ‘Mad Max: Estrada da Fúria’, uma das raras ocasiões recentes em que um filme de ação entregou ao mesmo tempo cenas explosivas, uma história envolvente e subtexto social, sem focar em um destes aspectos em detrimento dos outros. O diretor alcançou até mesmo a façanha de levar seu longa alucinante para a temporada de premiações, que foi indicado a várias categorias no Oscar (inclusive nas almejadas que eram de Melhor Direção e Melhor Filme). Nada mal para a sequência de uma franquia feita de alta-octanagem e violência criada 35 anos antes. Depois de ter dirigido as duas películas da saga animada ‘Happy Feet: O Pinguim’, estar volta às origens era tudo que George Miller precisava para seu nome ficar em evidência novamente. O público prontamente se pôs a aguardar pelo próximo filme da franquia ‘Mad Max’, mas Miller tinha outros planos.

O novo projeto do cineasta antes do vindouro ‘Furiosa’, prequel de ‘Estrada da Fúria’, não poderia ser mais diferente de suas obras dos anos 2000. Nada de pinguins dançarinos digitais ou perseguições no deserto: Miller surpreende o público em ‘Era Uma Vez Um Gênio’ ao contar uma história sobre histórias. Na trama, durante uma viagem a Istambul, uma acadêmica solitária chamada Alithea (Tilda Swinton) se depara com uma garrafa mágica onde vive um gênio (interpretado por Idris Elba) que oferece a ela a realização de três desejos. O encontro entre estas duas figuras ímpares desencadeia uma série de relatos fantásticos e absurdos que revelam a Alithea quais são seus desejos mais profundos. O texto é uma adaptação do conto ''The Djinn in the Nightingale's Eye: Five Fairy Stories'', de A S Byatt.

Créditos: Divulgação   
A equipe do filme apresentou a produção no Festival de Cannes em Maio deste ano

Trata-se de um filme potencialmente divisivo. Tanto pelo currículo recente do diretor quanto pela divulgação da obra, ‘Era Uma Vez Um Gênio’, talvez leve o público a esperar algo bastante diferente do que acaba por ser. Na verdade, temos aqui um enredo bastante simples, porém efetivo, enriquecido pela inventividade estética de seu idealizador, com camadas valorizadas mais pelo apelo emocional e narrativo do que por intrigas ou reviravoltas. Partindo do conceito de filme de câmara (obra passada num espaço limitado protagonizada por poucos personagens), o longa de Miller nos tranca num quarto de hotel com Tilda Swinton Idris Elba ao mesmo tempo que nos leva para diversas e peculiares paisagens por meio da concretização visual das incríveis descrições contadas pela criatura imortal recém-libertada. Através da narração destas aventuras fantásticas, o filme reflete sobre como histórias trazem coerência e significado à experiência humana. Para tal, abraça as possibilidades fantásticas de sua trama surreal, oferecendo desejo, cores, violência e (por que não?) ingenuidade em doses que se integram para construir uma bela fábula.

Tanto visual quanto narrativamente, ‘Era Uma Vez Um Gênio’ faz lembrar de outro filme que dividiu o público em grandes expectativas e comparações: ‘A Viagem’, parceria de Lana e Lilly Wachowsky com Tom Tykwer, no qual tramas paralelas passadas e tempos diferentes impactam-se entre si. No longa de Miller, contudo, tudo gira em torno dos contos do personagem de Idris Elba, entre sua solidão e suas paixões trágicas, que repercutem diretamente na vida apática da professora de Literatura que tem sua vida balançada pela materialização do fantástico que existia apenas em sua mente. Tanto ‘A Viagem’ quanto ‘Era Uma Vez Um Gênio’ possuem visuais criativos e mirabolantes que parecem convidar para grandes cenas de ação, mas que frequentemente renegam a grandiosidade estética em favor da simplicidade e poder do relato, da exposição da vivência (ou da frustração pela falta dela).

Trailer


Ficha Técnica
Título original e ano: Three Thousand Years of Longing, 2022. Direção: George Miller. Roteiro: George Miller e Augusta Gore - baseado no conto ''The Djinn in the Nightingale's Eye: Five Fairy Stories'', de A S Byatt. Elenco: Tilda Swinton, Idris Elba, Pia Thunderbolt,  Berk Ozturk, Anthony Moisset, Alyla Browne,  Sage Mcconnell, Abel Bond, Agani Gecmez. Gênero: Fantasia, Drama, Romance. Nacionalidade: Austrália, Estados Unidos da América. Trilha Sonora Original: Junkie XL. Fotografia: John Seale. Edição: Margaret Sixel.  Design de Produção: Roger Ford. Direção de Arte: Sophia Dash e Nicholas Dare. Figurino: Kim Barret. Distribuição: Paris Filmes. Duração: 01h48min.
Miller presenteia o público com um filme sensível e, com o uso de belos cenários e uma trama bem-amarrada, que oscila entre o bizarro e o romântico, cria uma obra ambiciosa sobre a busca de conexão humana e reconhecimento. Talvez não fosse exatamente o que fãs de ‘Mad Max’ estivessem esperando do diretor, mas pode surpreender e encantar quem se permitir embarcar nessa viagem inusitadamente bonita.

HOJE NOS CINEMAS

Escrito por Petterson Costa

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