Bizarros Peixes das Fossas Abissais | Assista nos Cinemas

 
“Tal como uma girafa que bebe a urina da fêmea para verificar se ela está fértil, eu sei o que fazer”! 

O animador Marcelo Marão é um curta-metragista consagrado, tendo recebido diversos prêmios em festivais internacionais, com destaque para o simpático “Chifre de Camaleão” (2000), no qual dois répteis disputam a atenção de uma fêmea, num cenário em preto-e-branco que, pouco a pouco, passa a ser impregnado por cores. Nas produções do diretor, o esmero visual chama muito mais a atenção que a trama em si, ainda que esta também impressione pelos flertes com o surrealismo… 

Neste seu primeiro longa-metragem, tais componentes estilísticos ficam mais evidentes: na abertura, conhecemos alguns personagens que, em ações inicialmente isoladas, logo estarão interconectadas. Primeiro, aparece um velhinho, reclamando do tamanho de seu nariz, ao qual ele se refere como “napa”; depois, uma garota que briga com alguns animais para resgatar os cacos de um determinado objeto, e os ataca fazendo com que as suas nádegas transformem-se num gorila; por fim, uma tartaruga minúscula, que sofre de Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) e se esforça para organizar alinhadamente as mercadorias do estabelecimento comercial para o qual trabalha. Um prólogo bastante promissor, portanto! 

Para fugir de seus agressores, a protagonista feminina de “Bizarros Peixes das Fossas Abissais” (2023) monta numa nuvem voadora, que sofre de “incontinência pluviométrica”. Esta logo será apresentada à tartaruga dublada por Rodrigo Santoro, depois que uma tempestade desorganiza as mercadorias do local onde ela estava. Em comunhão, estes personagens unirão forças para resgatar um vaso com poderes mágicos, em posse de “rinocerontes espaciais que expelem suco de graviola sem açúcar”, visto que, graças a este utensílio, a garota pode ajudar o seu avô a ser curado do Mal de Alzheimer. Como não ficar fascinado por uma trama como esta? 

Trailer



Ficha Técnica
Título original e ano: Bizarros Peixes das Fossas Abissais, 2023. Direção e Roteiro: Marão. Elenco Vozes: Natália Lage, Guilherme Briggs e Rodrigo Santoro. Nacionalidade: Brasil. Gênero: comédia, animação. Trilha Sonora: Duda Larson. Direção de Arte: Marão. Animação: Marão, Rosaria e Fernando Miller. Montagem: Alessandro Monnerat + Yohana Lazarova. Produção Executiva: Letícia Friedrich. Financiamento: Secretaria de Cultura do Estado do Rio de Janeiro, Fundo Setorial do Audiovisual - ANCINE, BRDE e BNDES - Banco Nacional do Desenvolvimento. Distribuição: Vitrine Filmes. Duração: 75 min.
Apesar de haver um objetivo determinado para que a narrativa avance, o diretor prefere fazer com que nós contemplemos as possibilidades dos instantes de interação entre os personagens e os experimentos imagéticos, como aqueles percebidos na longa seqüência do balé aquático que ocorre quando é justificado o excêntrico título do filme. O competentíssimo dublador Guilherme Briggs empresta sua voz à simpática nuvem cúmulo-nimbo, enquanto Natália Lage é responsável pelas falas e monólogos da personagem feminina. Desempenhos mui elogiáveis, em todos os casos. 

Numa das várias seqüências prodigiosas deste filme, os personagens, antes de viajar para a Sérvia, são convidados a conhecer o mundo através dos “Olhos de Fernando Miller”, numa das várias homenagens que o diretor faz ao seu próprio universo afetivo, como quando situa um importante encontro em frente ao Armarinho Estrela Dalva, do qual é proprietário e que fica localizado no município de Nilópolis, no Rio de Janeiro. Mesmo que não compreendamos inicialmente estas referências pessoais, elas são fascinantes, bem como a conclusão abrupta do filme, que traz consigo um conselho elementar, relacionado à importância de aproveitar a vida no fulgor de seus instantes atuais, antes que estes desvaneçam, da mesma maneira que algumas memórias se perdem… 

Créditos: Vitrine Filmes
A produção faz parte da incrível ''Sessão Vitrine Petrobrás'' e chega aos cinemas com preços acessíveis

Sobremaneira criativo na exposição dos traços autoriais e peculiares do realizador, o roteiro deste filme, intencionalmente evasivo em suas proposições tramáticas, rende diálogos brilhantes, como quando a garota metamórfica alega que “precisa comer dois mil metros quadrados de grama, senão a cidade de Araraquara vai sumir” ou quando ela demonstra que, sempre que recorre aos seus poderes de transformação animal, algo de estranho acontece no mundo, como a “eliminação da letra J do alfabeto brasileiro” ou a “conversão da terça-feira em dia de descanso oficial na América do Sul”. Os chistes, enfatizamos, são divertidíssimos! 

Por motivos óbvios, o conteúdo deste longa-metragem animado é direcionado proritariamente às platéias juvenis e adultas, possuindo variegados elementos de cariz psicodélico. Mas, como é um filme que possui elaborado cuidado com os jogos de cores, sobreposições e reconstituição das características extravagantes de seres submarinos pouco conhecidos, pode seduzir também o público adolescente, que esteja disposto a viajar pelas amplidões sensórias do realizador, da mesma maneira que o avô da protagonista que, numa situação resolutiva, identifica parte de seu corpo com um brontossauro da era Mesozóica. É um enredo que fez uma cuidadosa pesquisa biológica, além de contar com os adequados temas musicais do compositor Duda Larson. Muito, muito bom: à altura do que esperávamos de um artista tão consagrado quanto inspirado!

HOJE NOS CINEMAS

Escrito por Wesley Pereira de Castro

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